sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Cenas de um Casamento, de Ingmar Bergman


Não fossem as extensas 2h40 de duração, o clássico Cenas de um Casamento, do sueco Ingmar Bergman, não teria me cansado após o que seria o tempo normal de um filme com seus noventa e poucos minutos. Mas nada que tire o merecimento desse drama de 1973, vencedor do Globo de Ouro de Filme Estrangeiro.

Temos a história de Johan e Marianne, um casal bem sucedido que mantém um casamento aparentemente perfeito. Até que Johan se apaixona por uma mulher mais nova e abandona Marianne. A partir desse conflito entramos em contato com os sentimentos desconhecidos que surgem entre eles, o que os leva a um declínio conjugal. É um filme altamente psicológico e sustentado principalmente pelos diálogos inteligentes e precisos que sobrevivem bem ao escasso cenário e à ausência de trilha sonora, o que não dá muita margem a inclinações comoventes. Palavras a seco, dentro de um aspecto teatral, nos fazem de testemunhas nas questões discutidas pelo casal, como se presenciássemos pessoalmente os altos e baixos de Johan e Marianne.

Não que Bergman faça questão de revelar o pessimismo do matrimônio. Ele traz à tona os incômodos da rotina, das obrigações familiares, do sexo, dos filhos, dos bens e de tantas outras questões simples que tornam-se complexas quando a sujeira é varrida pra debaixo do tapete como se fosse uma grande arte. Mas também mostra o outro lado da moeda, onde o respeito e a amizade é o que há de mais valoroso numa relação amadurecida pelo tempo.

Esse foi meu primeiro contato com um filme de Bergman. A impressão é a de que ele fazia um cinema humano e que levantava questões. Através de Cenas de um Casamento, Bergman foi realmente capaz de tirar o espectador de uma situação indiferente ou passiva a respeito de um assunto e sacudi-lo através de sua arte. Fui "vítima" desse sacode, o que me fez despertar o desejo de saber mais sobre a obra desse grande artista sueco.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Clube da Luta, de David Fincher


Diz um ditado que existem mulheres que conquistam o homem pelo estômago através de uma boa comida. Da mesma forma existem os filmes que conquistam o público ou parte dele com uma única música ou com uma trilha sonora que o pegue de jeito. Não sou nem de perto um especialista em trilhas para cinema. Um curso ou um bom livro seriam muito bem-vindos e assim eu poderia futuramente passear com um pouco mais de propriedade sobre o assunto. Por enquanto considero-me um simples espectador que possui a mesma sensibilidade auditiva da maioria dos mortais, diferenciado apenas pelas minhas preferências e impressões pessoais.

Minha atenção estalou quando assisti Sangue Negro numa dessas salas de som digital. Senti uma perturbação crescente ouvindo aquelas batidas marcadas que pareciam não combinar em nada com as planícies bucólicas onde se fazia a extração de petróleo. Um cenário que definitivamente parecia exigir um som mais pacífico. Porém a história era o maestro, e não a paisagem. O suspense, mantido em todo o tempo pelo som desconcertante, fez da trilha a grande protagonista do filme. A atenção do público era sustentada principalmente pelo som sinistro. A partir de Sangue Negro, passei a dar uma atenção mais carinhosa às trilhas.

Voltando um pouco mais no tempo, uma das minhas trilhas prediletas, que eu tinha gravada numa fita cassete, é a de Coração Valente, filme dirigido por Mel Gibson em 1995 e que conquistou o prêmio de Melhores Efeitos Sonoros entre as cinco outras estatuetas conquistadas na edição de 1996 da maior premiação de cinema do mundo . Outra trilha que tinha gravada em fita cassete: Rocky IV, filme de 1985, com a histórica Eye of the Tiger. As músicas de Coração Valente e de Rocky IV tinham o poder de me fazer assistir o filme mental e detalhadamente. Esse é o verdadeiro poder de uma trilha bem feita. Outro caso interessante foi o de Shrek Terceiro, que tocou num dado momento do filme Do You Remember Rock N´Roll Radio?, dos Ramones, uma das minhas bandas preferidas. Naquele momento, de frente pra tela com o ogro verde e com Ramones tocando em alto e bom som, me veio à mente um outro filme (bem mais viajante que Shrek): eu levantando da poltrona e soltando os bichos num pogo tipicamente punk. Mas estava na formalidade do cinema e dali seria posto pra fora caso tivesse um acesso de loucura entre meus semelhantes. Minha próxima meta é gravar a genial trilha de Kill Bill, do cineasta top da minha lista.

E assim aconteceu quando assisti nesse fim de semana o filme Clube da Luta, dirigido por David Fincher. O auge, na minha opinião, não foram as cenas de luta, nem de sexo, nem de insanidade. O auge foi a última música na cena final que coroou o filme: Where is My Mind, do Pixies, banda que fez parte de toda a minha adolescência punk e que reinará para sempre nos HD´s da minha vida. Nenhuma outra música poderia ter sido melhor encaixada do que essa, totalmente pertinente à confusão mental do protagonista. Não só a letra, mas o som também trouxe mais alma pro final apoteótico. Aquele sim foi um final feliz e digno para um espectador como eu, surpreendido com o que há de melhor em sua raíz musical. O filme poderia ter sido até mais ou menos, mas já teria valido à pena pelo simples fato de ter Pixies nos últimos minutos. A música trazia o filme inteiro dentro de si - início, meio e fim. Confesso que não dei atenção suficiente ao restante da trilha, mas se só tivesse essa música, como já disse, seria o suficiente.

O crédito, obviamente, vai para o roteiro bastante original e para as brilhantes atuações de Edward Norton e Brad Pitt. Edward Norton faz o papel de um investigador de seguros que tem um confortável padrão de vida mas que devido às suas ansiedades prefere conviver com pessoas problemáticas que frequentam terapias grupais (pessoas com câncer, com tuberculose etc). Dessa forma ele tenta aliviar seus anseios. Nessas reuniões ele faz amizade com Marla, uma mulher com tendências suicidas. Tudo muda quando ele inicia uma estranha relação de amizade com o personagem de Brad Pitt, Tyler Durden, um excêntrico vendedor de sabonetes. Os dois passam a morar juntos numa mansão caindo aos pedaços após uma misteriosa explosão no apartamento do investigador de seguros e fundam assim o Clube da Luta - um clube que tem como membros homens que se socam violentamente, como se estivessem numa terapia. A originalidade do roteiro é o que me fisgou. E quando roteiro, atuações e trilha estão em sincronia, a arte sobra, como foi o caso desse cultuado filme de 1999. Se é que a arte pode de alguma forma sobrar nas obra-primas dos grandes artistas.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Grindhouse: À Prova de Morte, de Quentin Tarantino


Quando assisti Grindhouse: Planeta Terror há um tempo atrás, não sabia que o filme fazia parte do segundo episódio (vamos assim dizer) da produção da dupla Quentin Tarantino e Robert Rodriguez. Somente agora, pesquisando em sites de cinema, é que descobri que os dois cineastas produziram juntos, numa única película, um filme dividido em duas partes numa homenagem aos filmes B dos anos 70, que não contavam com a primazia da qualidade mas divertiam o público em cinemas baratos, conhecidos como Grind Houses.

Planeta Terror, dirigido por Robert Rodriguez, já havia me impressionado bastante, tanto pela paródia aos filmes de zumbis como pela presença de uma das personagens femininas mais punks e, na minha opinião, mais fascinantes do cinema moderno, Cherry Darling, vivida pela musa Rose McGowan. Cherry Darling tem um encanto feroz, tem no olhar uma voracidade sensual e, principalmente, tem no lugar da perna uma genial metralhadora que extermina zumbis a torto e a direito. Planeta Terror lembra muito Um Drink no Inferno, também dirigido por Rodriguez e com a participação de Tarantino no elenco.

Ontem assisti a primeira parte do filme, Grindhouse: À Prova de Morte, dirigido dessa vez por Tarantino. Os zumbis são deixados de lado e dão espaço a um serial killer das estradas, vivido por Kurt Russell. De primeira me conquistou por ter em sua história um assassino totalmente atípico que não empunha facões, machados, picaretas ou motosserras para liquidar suas vítimas, mas sim um carro "à prova de morte".

Inicialmente pensei que o filme fosse remeter ao clássico Encurralado, de Steven Spilberg, mas logo essa comparação cai por terra quando nos trinta minutos iniciais é apresentado aos espectadores o rosto do psicopata das estradas, ao contrário do longa de Spilberg, cujo rosto do motorista do sinistro caminhão não é mostrado. Aliás, genial o nome do serial killer: Dublê Mike.

Uma característica latente do filme, tratando-se de Tarantino, são os diálogos intermináveis. Outro dado interessante é o uso de câmeras, personagens e outras situações presentes no filme Kill Bill. O xerife local Earl McGraw, por exemplo, que aparece em Kill Bill na cena em que averigua o massacre ocorrido numa igreja, também aparece em À Prova de Morte, quando faz para o espectador um raio-X de apresentação do serial killer dentro de um hospital. Também temos a cena final do espancamento, muito similar à sequência em desenho animado de Kill Bill. Outro detalhe interessante é a música "Twisted Nerve", assobiada por Daryl Hannah em Kill Bill, que vem dessa vez em forma de toque de celular de uma das personagens. Ainda devo dizer que não pode ser coincidência as cores preto e amarelo do uniforme de Uma Thurman em Kill Bill serem as mesmas do carro em que um dos grupos de meninas dirige.

Os pés fazem parte do fetiche de Tarantino, outra descoberta que fiz perambulando pelos blogs de cinéfilos, e por isso há cenas que realçam os pés das personagens, como a cena de abertura.

Tanto quanto a dança de John Travolta e Uma Thurman em Pulp Fiction, a cena da "dança no colo" de À Prova de Morte já entrou para o meu hall particular de cenas clássicas do cinema.

Alguns atores e atrizes de Planeta Terror estão presentes tanto na primeira quanto na segunda parte de Grindhouse. Rose McGowan pode não ter uma perna-metralhadora dessa vez, porém surge como a dona de uma das mortes mais originais e bizarras que já assisti. O elenco ainda conta com uma pequena participação do ator Eli Roth, que fez o excelente personagem O Urso Judeu de Bastardos Inglórios.

À Prova de Morte mudou meu conceito sobre ação sobre quatro rodas e sobre o gênero terror. Os fãs de Tarantino e os que curtem Rodriguez terão um prato cheio. Nada poderia dar mais certo do que a parceria entre esses dois gênios da sétima arte.

domingo, 21 de fevereiro de 2010

Amantes, de John Cassavetes.


Robert Harmon é um romancista que vive cercado por mulheres. Ele trabalha em um novo livro e busca a matéria-prima de suas idéias na boemia. Seu ritmo de vida, que tem como pontos principais a dedicação ao seu novo projeto e a atenção às mulheres que transitam por sua casa, é interrompido com a chegada de sua irmã Sarah, que está passando por um doloroso processo de divórcio e que ao mesmo tempo tenta tratar-se de problemas psicológicos depois de passar por algumas instituições psiquiátricas. Sarah sofre ainda pela filha Debbie, que durante uma audiência do divórcio decide viver com o pai. Para completar o inusitado na vida de Robert, seu filho Albie, de oito anos, é deixado aos seus cuidados pela ex-mulher. E assim o escritor tem que lidar com essa estranha família dentro de sua casa, o que o obriga a mudar todos os seus hábitos e a rever alguns conceitos.

Ainda não conhecia o trabalho de John Cassevetes. Ele é o diretor, o roteirista e o protagonista do filme e ainda contracena com sua própria mulher, Gena Rowlands, que faz a irmã problemática que, aliás, está impagável na cena em que vai a um abrigo de animais a fim de comprar um “bebê” para equilibrar a vida de seu irmão. Ela enche um táxi com pôneis, cabra, galinhas, pintinhos, um cachorro e despeja todos no quintal de Robert.

Amantes é um filme de 1984. Interessante observar o figurino da época, os cabelos armados e as músicas. Exceto por algumas longas tomadas estáticas que me entediaram até ocorrer alguma ação ou diálogo, considerei o filme ótimo, o que me despertou a curiosidade para assistir outros filmes do cineasta, como A Morte de um Bookmaker Chinês, de 1976, ano em que vim ao mundo.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

A Noite dos Mortos-Vivos, de George Romero


Não tinha motivo nenhum para não gostar de filmes de zumbis, afinal de contas o primeiro filme desse gênero que assisti quando moleque foi o excelente trash A Volta dos Mortos-Vivos, de Dan O´Bannon, de 1985, e que muito me impressionou. Aos 10 anos de idade nunca havia visto vísceras e cérebros sendo devorados por criaturas bizarras e com uma exposição tão crua. Os demais filmes de zumbis ficaram pequenos depois desse grande clássico. Nenhum outro me impressionou tanto, o que me fez evitá-los por um bom tempo. Minto: exceto Planeta Terror, de 2007, com o toque de Tarantino. Mas esse filme é outro papo por ter sido feito propositalmente num formato B-movie e exige um outro tipo de olhar.

Esse meu jejum de anos foi quebrado ontem após assistir A Noite dos Mortos-Vivos, de 1968, do mestre George Romero. Obviamente a produção não teve os recursos de efeitos especiais existentes hoje no mundo do cinema, porém não deixou a desejar em nada no que se refere aos principais quesitos presentes nos filmes de terror.

A claustrofobia dos personagens acuados dentro de uma casa isolada num campo e cercada por seres comedores de miolos é a grande sensação causada pelo filme. Os zumbis beiram o ridículo dos defuntos clássicos vestidos de terno e gravata ou de camisola. Com suas caras brancas e com o andar arrastado, os monstros não pareciam oferecer muita resistência a quem se dispunha a enfrentá-los com disposição. Parecia ser muito fácil fazer uma fuga com toda aquela locomoção lenta deles. Mas ainda assim Romero nos convence do pânico se supostamente estivéssemos no lugar dos personagens. E que personagens convivendo sobre pressão dentro da casa! Três mulheres - sendo uma delas louca -, uma menininha que cai doente depois de ter sido ferida por um monstro, um homem que tenta agressivamente levar todos para o sótão, um rapaz com cara de idiota e um homem que passa o tempo todo ateando fogo em objetos para afastar os zumbis e vedando portas e janelas com as madeiras dos móveis que ele freneticamente desmontava. Prego era o que não faltava na casa.

Os atores deixam a desejar, mas isso não reduziu em nada o valor dessa grande obra. Sem contar que as atuações com socos, tapas, pauladas e empurrões desferidos são primárias e cômicas.

Depois de A Noite dos Mortos-Vivos resolvi acrescentar alguns zumbis à minha lista de filmes a serem assistidos que me atraíram pela originalidade do roteiro: Zumbilândia, Dead Snow, REC e Dead Set.

Mestre Romero não tem o poder apenas de ressuscitar mortos mas, através de seu cinema, ressuscitar dentro de alguns, que já se consideravam mortos para os filmes do gênero, uma nova percepção pelo mundo dos zumbis.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

O Ódio, de Mathieu Kassovitz


Esse filme de 1995 tem como protagonista Vincent Cassel fazendo o papel de um jovem judeu desajustado, Vinz, que promete matar um policial caso seu amigo Abdel, vítima de um espancamento aplicado num interrogatório em decorrência de um conflito com a polícia, venha a falecer. Num período de 24 horas após o confronto, Vinz e mais dois amigos caminham pelo bairro onde moram. É noticiado na TV que durante o conflito um policial perde uma arma carregada. É Vinz quem a encontra, e assim passa a andar armado e a se meter em situaçõe onde prevalece o grande suspense do filme: Vinz terá ou não coragem de fazer uso da arma contra um policial?

Vincent Cassel, bem mais jovem e com aspecto de skinhead, fez bem o papel de desajustado. Atualmente esse francês é um dos meus atores preferidos. Ainda não havia assistido filmes com ele mais novo. Os últimos foram já na sua fase mais madura da idade e da profissão - os excelentes "Inimigo Público Nº 1 - Instinto de Morte (parte 1)" e "Senhores do Crime" e o ótimo "À Deriva". Portanto sou suspeito para falar dos filmes onde Vincent Cassel está presente com sua brilhante atuação. E se houver um parafuso a menos na mente do personagem interpretado por ele, melhor será.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Fogos na Planície, de Kon Ichikawa


Acabo de assistir Fires on the Plain (no Brasil, Fogos na Planície), filme antibelicista de 1959 dirigido pelo japonês Kon Ichikawa (1915-2008). O filme mostra a trajetória de Tamura, um soldado japonês que após ser rejeitado por sua companhia devido à escassez de comida pra sua tropa e, posteriormente, rejeitado pelo hospital que tratou de sua taberculose, torna-se um errante que tenta sobreviver na floresta em meio a bombardeios americanos nas Filipinas, em 1945. Com apenas um punhado de sal, alguns inhames e uma granada,Tamura tem a companhia de soldados maltrapilhos que se arrastam com fome e sede, cometendo inclusive atos de canibalismo tamanho o desespero pela vida.

Tamura é um personagem cômico com sua cara de bobo, seu jeito submisso e sua postura desengonçada. Alguns outros personagens também são interessantes em meio àquela miséria militar, como o soldado aleijado que guarda tabaco no bolso para trocar por carne com um companheiro que diz caçar macacos na floresta.

Seria insano quem dissesse que há algum tipo de beleza na guerra, porém Setsuo Kobayashi conseguiu extraí-la através de uma fotografia em preto e branco extraordinária.

A peculiaridade do tema inanição na guerra, trazida à tona pelo olhar de Ichikawa, sem sombra de dúvida faz de Fires on the Plain um dos melhores filmes de guerra da história do cinema japonês e do cinema mundial.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Bulgária fora da briga

The World is Big and Salvation Lurks Around the Corner, do búlgaro Stephan Komandarev, ficou fora da briga pela estatueta do 82ª edição do Oscar.

Como ainda não assisti os filmes concorrentes ao prêmio de Melhor Filme Estrangeiro, não tenho opinião formada sobre a briga. Espero ainda nessa semana assistir o elogiado A Fita Branca, que concorre a essa indicação

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

A Culpa é do Fidel, de Julie Gavras


Estava para assistir A Culpa é do Fidel há um bom tempo. Nesse fim de semana finalmente aluguei o DVD, atraído principalmente pelos elogios que ouvi sobre a atuação da atriz mirim Nina Kervel-Bey. Nina, fazendo o papel da questionadora Anna de la Mesa, já faria valer a locação do filme dirigido pela cineasta francesa Julie Gavras. No entanto não somente Nina fez valer, mas sim a bela história que gira em torno da pequena porém grandiosa personagem Anna.

Não é preciso ter vivido parte da infância num lar comunista para se entender o que se passa na cabeça de uma criança que se depara com situações onde adultos subestimam o entendimento infantil. Quem, enquanto criança, nunca descobriu dramas familiares através de tropeços e escorregões de pais, tios e avós, ou até de empregadas fuxiqueiras? Os questionamentos de Anna poderiam ser muito bem adaptados a outros assuntos como separação, doença ou morte na família , mudança de lar etc. A coisa principal do filme não é a posição política dos pais da menina e nem a situação da França, como pode parecer à primeira vista, mas o poder de absorção e de entendimento a que uma criança está sujeita diante das questões que envolvem os adultos e, a partir disso, o consequente e inevitável nascimento das primeiras impressões a respeito do mundo.

Através da sensibilidade típica de uma criança acima do seu tempo, somos levados a refletir sobre nossas posições tantas vezes engajadas ou carregadas de equívocos. E se alguma poesia chegar aos olhos e ouvidos de vocês através do mundo de Anna, a culpa é de Julie Gavras.